ESTÉTICA
Estética é um ramo da filosofia que se ocupa
das questões tradicionalmente ligadas à capacidade humana de perceber o mundo,
tais como o belo, o feio, o gosto, a arte, os estilos, as tendências, a criação
e a interpretação artística. A estética adquiriu autonomia como área
filosófica, com Alexander Baumgarten, no século XVIII, quando ele publicou a
obra Aesthetica. A palavra estética vem do grego aisthetikós (ou aisthésis) e
pode ser traduzida como percepção, faculdade de sentir, compreensão pelos
sentidos etc.
Durante a Antiguidade, a estética era
conjugada com as demais áreas da filosofia. Hoje está claro que essa disciplina
ocupa-se da capacidade de julgar as emoções e os sentimentos estéticos, ou
seja, ocupa-se de nosso senso estético, como se desenvolve, se pode ou não ser
condicionado, se é inato, se é adquirido e tem de ser cultivado etc.
Em síntese, a estética reflete racionalmente
sobre a capacidade humana de julgar o belo o feio, assim como a gama de
sentimentos que nos invadem quando exercemos tal capacidade diante de algo. Por
isso, em nosso dia-a-dia, na linguagem coloquial, empregamos o termo estética
para fazer alusão à aparência das coisas. O estudo reflexivo da capacidade
humana de julgamento do belo e do feio e da percepção que temos do real é muito
importante, pois tudo o que consumimos, de alimentos a roupas, de bicicletas a
carros, de livros a aparelhos eletroeletrônicos, envolve a estética.
OBJETOS DE ESTUDO
O belo
O belo é o resultado de uma espécie de juízo
que exercemos sobre a realidade. Consideramos belo todo objeto ou pessoa que
nos suscita determinado prazer estético por meio de sua contemplação. Esse
sentimento estético desinteressado pode ser provocado pelas coisas da natureza
(pessoas, animais, paisagens etc) ou pelo fruto do engenho humano (arquitetura,
arte).
Pensemos um pouco sobre a beleza. Será que
existem padrões universais que apontam para modelos de beleza ou trata-se de
algo relativo, que está sujeito às variantes históricas e sociais? Visto o
problema de outra forma: A beleza é algo que podemos mensurar? Trata-se de algo
objetivo, ou seja, está nos objetos? Depende de elementos subjetivos? Se assim
for, o conceito de beleza pode mudar de pessoa para pessoa. As respostas a
essas perguntas variam no decorrer da história da filosofia.
O feio
O problema do feio está intimamente ligado às
questões relativas ao belo, ou melhor, está contido na problemática do belo.
Por conclusão lógica, derivada do próprio conceito de belo, o feio seria o que
nos provoca sentimento não agradável mediante sua contemplação. A contemplação
do feio não é algo gratuito, algo aprazível àquele que o contempla, ao
contrário, causa estranheza a este, que faz de tudo para abreviar o contato com
o que foi julgado feio. Aqui são pertinentes as mesmas questões propostas em
relação ao belo, relativas à subjetividade da feiúra.
O gosto
É uma faculdade autônoma do sentimento cuja
atribuição básica é o exercício contínuo da atividade estética. Pode-se,
portanto, dizer que através do gosto exercitamos o juízo estético. É justamente
o gosto que nos predispõe a julgar os objetos do sentimento, mediante a
capacidade que eles têm de nos causar satisfação.
É muito importante salientar que a
problemática relativa ao gosto não pode, simplesmente, ser reduzida a uma opção
arbitrária e imperativa de nossa subjetividade, dado que pressupõe a integração
do conjunto de estruturas subjetivas que operam sobre dados objetivos. Se
fecharmos a questão nessa perspectiva arbitrária, o gosto passa a ter caráter
irrevogável, monolítico e estático. Assim não há margem para a evolução, para a
aprendizagem criativa, para a educação ou mesmo reeducação da sensibilidade, o
que gera a estagnação.
Para o aprimoramento, para a educação ou
reeducação do gosto frente à potencialidade estética da realidade que nos
cerca, nossas faculdades subjetivas precisam estar abertas, prontas para
acolher e interessadas mais em conhecer do que em preferir. Assim evitamos os
descartes e as adesões a priori da
pluralidade do real, permitir que ele fale, estabelecendo, assim, um diálogo e
não um monólogo.
Portanto, o gosto é a capacidade de emitir
julgamentos estéticos sim, mas sem preconceitos ou posições tendenciosas. O
contato direto com a realidade e com as obras deve formar nosso gosto, modificá-lo,
educá-lo, destruí-lo, reconstruí-lo etc. Caso nos limitemos a nossos portos
seguros, ou seja, àquilo que conhecemos e já sabemos que gostamos dele, não
crescemos.
Arte
É uma das formas mais poderosas de expressão
humana. Ela é capaz de materializar crenças, convicções, ideologias. É capaz de
formar consciência e opinião, mas também é capaz de obscurecer as mentes e
anular as opiniões. É capaz de libertar, emancipar, mas pode servir como
instrumento de opressão e alienação. O maravilhoso e complexo universo
artístico é agora objeto de nossa reflexão.
A arte é uma possibilidade de conhecimento do
mundo, pois o conhecimento deste não se limita às ciências, à filosofia e ao
mito. A arte não segue o itinerário das outras modalidades de conhecimento,
trata-se de um conhecimento intuitivo do real em que estamos inseridos. Toda a
pluralidade do real pode ser objeto da arte.
Funções da arte
Função Mimética (relativo a mímese,
reprodução, cópia fiel etc.) – diz-se que arte que realiza sua função mimética
busca reproduzir de maneira fiel a realidade, quando imita a vida e a natureza.
A arte, como mímese, é testemunha fiel da complexidade do real. No entanto,
mesmo para reproduzir é preciso ler, desconfiar, interpretar. Assim, a arte em
sua função mimética desempenha papel importante na compreensão do mundo em que
estamos inseridos. Tal posição sustentou-se, aproximadamente, do século V a. C.
ao XIX d. C., até o aparecimento da fotografia, o que levou a uma revisão e
reestruturação do papel da arte, especialmente da pintura.
Função criadora da arte
A obra de arte abre horizontes novos e
inusitados. Por ela podemos não somente vislumbrar como a realidade é, mas como
poderia ser. Em outras palavras, junto e por meio dela, a realidade revela-se a
nossos olhos como algo sempre novo, como se jamais a tivéssemos experienciado.
Trata-se de uma espécie de transfiguração, quase uma revelação, do existente
numa outra realidade, no mundo da obra, que, muitas vezes, tem a capacidade de
ir além de onde o artista quis chegar, e revela coisas que independem da
vontade e intenção de quem produziu a obra. Trata-se, portanto, de outro
paradigma de realidade, em que a própria obra se constitui em real.
Função utilitária
Essa função diz respeito à tentativa de
utilização da arte para alcance de fins não artísticos. Aqui a produção
artística é avaliada e medida a partir do alcance dos fins exteriores a que se
propõe. São muitos os fins não artísticos que fazem da arte um simples meio
para atingi-los. Os fins podem ser religiosos, políticos econômicos etc. desta
perspectiva, em nenhum momento, nem em sua avaliação (que leva em consideração
aspectos morais e os fins almejados), a arte é encarada de maneira estética.
CONCEPÇÕES ESTÉTICAS
PLATÃO: uma visão negativa da arte
A famosa teoria platônica das ideias, que
divide o universo em mundo sensível (material e inferior) e o mundo inteligível
(espiritual, imaterial e superior), é a chave de compreensão da teoria estética
de Platão. Segundo essa teoria, nossa grande missão é, por meio de várias
vidas, libertarmo-nos das amarras do mundo sensível, pois ele não passa de uma
cópia do mundo das ideias. Como faríamos isso? Ora, teríamos de buscar o
conhecimento verdadeiro (episteme), o
conhecimento do mundo ideal. O alcance do conhecimento verdadeiro aconteceria
pela reminiscência (lembrança) do que nossas almas, outrora presentes no mundo
ideal, presenciaram nele. Não podemos, portanto, iludir-nos com o mundo das
cópias, das sombras e das aparências, isto é, com o mundo sensível. Para
Platão, a arte era essencialmente mímese (mímesis),
então, reproduzia o mundo sensível. Reflitamos: se o mundo sensível já é uma
cópia do mundo ideal, então a arte é uma cópia da cópia.
Dessa maneira, a arte em nada nos ajuda a
alcançar o conhecimento verdadeiro, ao contrário, afasta-nos dele, uma vez que
nos distancia do mundo ideal. Do ponto de vista gnosiológico (conhecimento), a
arte é infinitamente inferior à ciência, e deve ser evitada.
Quando Platão fala que a arte está voltada
para as partes irracionais da alma (concupiscível e irascível), ele cria
resistência à arte também com relação à questão da moral, pois, atuando
diretamente sobre nossos sentidos, a arte acaba nos cegando, faz com que
percamos a noção do bem e do mal, do certo e do errado.
Com relação à música, Platão tem visão
extremamente otimista, é muito importante salientar que ele não considera a
música exatamente uma arte. Na trilha de Pitágoras, o filósofo ateniense julga que
a música é uma espécie de harmonia divina. Além disso, Platão coloca a música
em quarto lugar entre as ciências propedêuticas, atrás da aritmética, geometria
plana e sólida e astronomia.
ARISTÓTELES: uma visão positiva da arte
Também na estética o discípulo gradualmente
se distancia do mestre. Mesmo compartilhando com Platão o pensamento de que a
arte é essencialmente mímese, há entre Aristóteles e Platão diferenças
marcantes. Enquanto para Platão a mímese é alienadora, mentirosa e nada tem a
acrescentar, para Aristóteles, a mímese é um momento único de intercâmbio, em
que o artista tem a chance e o poder de acrescentar algo ao real. Por isso,
nesse novo contexto, a mímese não é pura imitação, mas criação que envolve
iniciativa e criatividade. Mediante sua capacidade criativa, o artista pode
transpor os limites da natureza.
No que diz respeito à tragédia, ela é a
mímese de uma ação, de um acontecimento, e não das paixões. É um processo ativo
de seleção de partes para apresentação. Não é passivo, cópia automática, como
supunha Platão. Aristóteles traz de volta a necessidade da habilidade para
fazer poesia: o poeta é um compositor-criador de tramas, e não de versos.
Embora a poesia não seja mímese do universal, Aristóteles sustenta que, mesmo
que os objetos da mímese não sejam universais, eles podem resultar em um
processo que apresente universais, porque a tragédia não trata de assuntos
banais.
ESTÉTICA MEDIEVAL
Durante a Idade Média, as artes não eram
muito valorizadas, a não ser como instrumento da catequização e de culto. A
influência da Igreja Católica era enorme. A busca pelo belo era identificada
pelo cristianismo predominantemente como a busca do espírito humano por Deus.
Dessa forma, o cristianismo contribuiu para edificar e difundir uma nova concepção
da beleza, cujo fundamento era a identificação de Deus com a beleza, o bem e a
verdade.
Nesse contexto, apesar de, como sabemos, ser
um representante da Antiguidade tardia, Santo Agostinho concebeu a beleza como
um todo harmonioso, isto é, comunidade, número, igualdade, proporção e ordem,
reflexo da perfeição e beleza do Todo-poderoso e de sua obra. Assim, Deus, de
onde tudo emana e pelo qual todas as coisas adquirem sentido, é a fonte
inesgotável de toda beleza e perfeição.
São Tomás de Aquino identificou a beleza com
o bem. Como em Santo Agostinho, a beleza perfeita identifica-se com Deus. As
coisas belas têm três características ou condições fundamentais, e as coisas
feias são seus opostos.
Vejamos:
Integridade ou perfeição (o inacabado ou fragmentário é feio); A proporção ou
harmonia (a assimetria e a desarmonia são feias); A claridade ou luminosidade
(a escuridão é feia).
CONCEPÇÃO EMPIRISTA E IDEALISTA
Os filósofos empiristas, como David Hume (século XVIII), relativizam a
beleza, reduzindo-a ao gosto de cada um. Aquilo que depende do gosto e da
opinião pessoal não pode ser discutido racionalmente, donde o ditado: “Gosto não se discute”. O belo, nessa
perspectiva, não está mais no objeto, mas nas condições de recepção do sujeito.
Hegel (século
XIX) foi um filósofo que trabalhou a questão da beleza numa perspectiva
histórica. Para ele, o relativo consenso acerca de quais são as coisas belas
mostra apenas que o entendimento do que é belo depende do momento histórico e
do desenvolvimento cultural. (...) Por isso, em Hegel, a beleza artística não
diz respeito apenas à sensação de prazer que determinada obra possa
proporcionar, mas à capacidade que ela tem de sintetizar um dado conteúdo
cultural de um momento histórico. Em outras palavras, a arte não é apenas
fruição, mas tem como função mostrar, de modo sensível, a evolução espiritual
dos homens ao longo da história.
KANT: o juízo estético, o belo e sublime
Todos os seres humanos emitem juízos
estéticos! Essa é a construção que dá início ao itinerário percorrido por Kant
para resolver o problema da objetividade ou subjetividade da estética. É
evidente, em Kant, a preferência pela segunda opção. “Aquilo que é puramente subjetivo na representação de um objeto, isto
é, o que constitui a sua relação ao sujeito, e não ao objeto, é a sua qualidade
estética”.
Diante
da existência inconteste dos juízos estéticos, o filósofo prussiano levanta
duas questões de capital importância: O que é o belo manifestado no juízo
estético? Qual é a estrutura, o fundamento que possibilita o juízo estético?
Em resposta à primeira questão, Kant atesta
que o belo não existe de maneira objetiva nas coisas, mas é fruto da relação
entre sujeito e objeto. Respondendo a segunda questão, Kant diz que o juízo
estético é fruto do livre jogo das estruturas cognitivas e da imaginação (o que
confere ao juízo status de universal), capaz de produzir um prazer
desinteressado, de nos direcionar para uma “finalidade
sem fim e de nos fazer compreender a escrita cifrada por meio da qual a
natureza fala conosco em suas belas formas”.
Segundo Kant, o belo e o sublime têm em comum
a característica de agradar por si mesmos, de maneira desinteressada, universal
e necessária, uma vez que são por excelência subjetivos. A diferença está no
fato de que o belo diz respeito à particularidade do objeto em sua relação com
o sujeito, e essa condição torna-o realmente limitado, ao passo que o sublime
também diz respeito ao supra-sensível, que é informe e que, como tal, implica a
representação do ilimitado.
Dessa forma, o objeto não é sublime, mas
desperta o sentimento do sublime, ou seja, somos induzidos a projetar no objeto
a ideia de sublime que ele fez despertar em nós. O sublime não é de forma
alguma objetivo, diz respeito ao sujeito. É pela experiência do sublime que
tomamos consciência de que podemos ultrapassar as barreiras sensoriais. “O sublime é pois essencialmente espírito; o
sentimento do sublime nos enleva deste mundo e nos abre, por assim dizer, as
portas do supra-sensível” (Pascal).
Texto extraído de:
GARCIA, José Roberto & VELOSO, Valdecir da Conceição. Eureka: construindo cidadãos reflexivos.
Florianópolis: Sophos, 2007.
Texto
elaborado pela professora de filosofia do Colégio Batista Daniel de La Touche
Rute Amorim.
Muito boa sua opinião!
ResponderExcluirGrato pela avaliação, créditos devidamente debitados na conta da autora.
ExcluirTive ensinar a meu filho, e em busca na net, encontrei este excelente texto. o que me facilitou bastante pela clareza e objetividade..... Parabéns.
ResponderExcluirFico grato por sua apreciação!
ExcluirGrande texto e bons fundamentos consegui fazer meu trabalho de investigação a partir deste texto obrigado
ResponderExcluirQue bom poder ajudar.
Excluirobrigado pela ajuda
ResponderExcluirExcelente iniciativa.Bela!
ResponderExcluirTexto com excelência e qualidade indiscutível!!!parabéns
ResponderExcluirEu não entendi isso aqui: Esse sentimento estético desinteressado pode ser provocado pelas coisas da natureza (pessoas, animais, paisagens etc) ou pelo fruto do engenho humano (arquitetura, arte).
ResponderExcluirNão seria?...
Esse sentimento estético INTERESSADO pode ser provocado pelas coisas da natureza (pessoas, animais, paisagens etc) ou pelo fruto do engenho humano (arquitetura, arte).
Ei, muito boa a postagem. Parabéns! :-)
ResponderExcluirTalvez tenha interesse em ver nossos posts sobre lipo de papada e vasos decorativos. Obrigado! ;-)
Muito obrigado!! Ajudou muito
ResponderExcluir