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domingo, 10 de setembro de 2017

A experiência estética e o juízo de gosto

Por: José Rogério de Pinho Andrade

A experiência estética possui um caráter emocional e contemplativo e é expressa por meio de termos como Belo, delicado, sublime, inspirador, gosto, comovente e outros. A forma mais complexa e intensa da experiência estética é proporcionada por meio da apreciação da arte. (GARDNER, 2002, p. 229). Enquanto a filosofia da arte investiga os sentidos da arte, a estética investiga os sentidos da experiência estética apontando questionamentos relativos ao Belo e à Beleza, bem como ao juízo de gosto que resulta da relação com o Belo e a Beleza.
Dentre as diversas reflexões produzidas sobre o tema, destacam-se as reflexões produzidas por David Hume e por Immanuel Kant no século XVIII. Para ambos, o juízo estético exemplifica o gosto e refere-se ao modo especial de uso das faculdades mentais caracterizado por ser uma resposta sentida a um objeto e por não ser definido por regras ou princípios. O interesse estético se dirige a objetos particulares e não a verdades universais.
Em tais concepções estéticas, contrariando as concepções clássicas e racionalistas anteriores, as qualidades estéticas não são objetivas, não são propriedades do objeto alcançadas pelo conhecimento estético delas. A postura destes pensadores pode ser classificada como subjetivismo estético, em contraposição ao objetivismo estético das concepções clássicas e racionalistas anteriores.
O subjetivismo estético nega que a experiencia estética resulte das qualidades estéticas próprias do objeto, embora admita a afetação estética do sujeito pelo objeto, mesmo que tal afetação não se equipare a um conhecimento das propriedades estéticas do objeto. De acordo com tal concepção, “a beleza de um objeto consiste em produzir certa resposta no sujeito”. (GARDNER, 2002, p. 231). Observou David Hume, que o gosto se apresenta diversificado e relativo. Entretanto, a razão de tal diversidade (e até divergência) resulta da carência “de métodos consensuais para alinhar juízos divergentes”. Quanto ao gosto e seu juízo próprio, não é possível apelar para regras e “as qualidades estéticas são elusivas em alto grau”. (GARDNER, 2002, p. 231).
Já o filósofo Immanuel Kant destaca que “o prazer é essencial para a experiência que fundamenta um juízo estético”. (GARDNER, 2002, p. 231). Entretanto, o prazer não designa nada no objeto: “um juízo estético simplesmente relata o estado mental do falante, e as preferências estéticas são equivalentes às preferencias de gosto”. (GARDNER, 2002, p. 231).
O gosto, embora de caráter subjetivista, não incorre em um relativismo irrestrito. Segundo Hume, é possível afirmar que há um padrão de gosto que reside na sensibilidade do sujeito, não no objeto: “os juízos estéticos não identificam qualidades estéticas inerentes aos objetos, mas tampouco se relacionam exclusivamente às experiencias do sujeito”. (GARDNER, 2002, p. 233). Para Kant, o juiz estético pressupõe a existência de um sentido comum nas apreciações, que é universal, universalidade condicionada e, por isto mesmo, diferente da universalidade lógica dos juízos do conhecimento e da moral, cujas conclusões são necessariamente universais e objetivas, passíveis de serem provadas e demonstradas. A universalidade que está pressuposta no juízo estético é essencialmente de caráter subjetivista, é a universalidade subjetiva, das condições do sujeito e não das qualidades do objeto. (MELANI, 2013, p. 309).
Para David Hume, o problema do gosto depende de fatos contingentes da natureza. Assim, algumas formas agradam ou desagradam por sua condição natural e, também, há “a uniformidade contingente da sensibilidade humana, a igualdade na ‘estrutura original da tessitura interna’ de nosso espírito” que explica que as sensibilidades humanas são do mesmo gênero e as diferenças resultem de sutilezas e outras deficiências de gosto determináveis. (GARDNER, 2002, p. 233-234).
Para Kant, os juízos estéticos estão relacionados “com uma faixa da nossa experiência, diferente da empírica, que é de caráter cognoscitivo, e diferente da experiência moral dos princípios universais válidos para a conduta”. (NUNES, 2002, p. 49). Os juízos estéticos ou juízos de gosto manifestam o Belo e a Beleza fundamentados em uma satisfação interior de caráter desinteressado, contemplativo, proveniente das representações ou intuições, desembaraçadas dos conceitos do Entendimento. (NUNES, 2002, p. 49). O prazer provocado pela experiencia estética difere do prazer sensível porque tende à universalização, enquanto este tende à experiência particular., assim, o Belo é de caráter universal, embora não objetivo.
Segundo Bendito Nunes (2002, p. 50), em Kant compreende-se que

No juízo de gosto, relacionado com a satisfação desinteressada, contemplativa, apreciamos a Beleza por si mesma, desprendida dos nexos causais que constituem a ordem natural dos fenômenos como se, através dela, se afirmasse nas coisas a liberdade da qual emanam os fins ideais integrantes da ordem ética, e que é uma afirmação no Espírito”.

Tanto em Kant, quanto em Hume, “o fato de os juízos estéticos poderem ser justificados distingue-os do mero gostar e torna-os, em sentido lato, racionais”. (GARDNER, 2002, p. 234). Neste sentido,

Oferecer razões em estética difere fundamentalmente de oferecer razões em outros contextos e possui peculiaridades que dificultam sua compreensão, pois as razões estéticas operam de modo independente de todas as condições que parecem essenciais ao próprio conceito de razão. (GARDNER, 2002, p. 234).


Por fim, segundo Kant, a atitude estética considera o objeto de maneira desapaixonada, desinteressada e “por si próprio”. Segundo Benedito Nunes (2002, p. 50), a “experiência estética estando subordinada a conceitos, ela também possui valor autônomo, independendo de qualquer finalidade exterior: é um fim em si mesma”. Além do mais, a concepção estética não restringe a qualidade estética à Beleza ou ao Belo, pois há outras qualidades estéticas como a elegância, graça, pungência, entre outras.

Referências:

GARDNER, Sebastian. Estética. In: BUNNIN, Nicholas; TSUI-JAMES, E. P. Compêndio de filosofia. Tradução Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

MELANI, Ricardo. Diálogo: primeiros estudos em filosofia. 1 ed. são Paulo: Moderna, 2013.

NUNES, Benedito. Introdução à Filosofia da arte. 5ª ed. 3ª imp. São Paulo: Editora Ática, 2002.

Um comentário:

  1. Ei, muito boa a postagem. Parabéns! :-)
    Talvez tenha interesse em ver nossos posts sobre lipo de papada e vasos decorativos. Obrigado! ;-)

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